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Minha vida

Minha vida
Cleide Freitas de Souza
out. 19 - 8 min de leitura
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Papai teve uma infância triste.

Quando criança por volta dos seis anos ele ficou órfão de pai e logo em seguida de mãe, ele quase não falava nesse assunto tinha poucas lembranças, com a morte dos pais cada um dos cinco irmãos tomou rumo diferente, mas sempre mantendo contato, os mais velhos arrumaram trabalho e os mais novos foram ser criados por amigos da família. Meu pai dizia que tinha passado por muitas dificuldades, a família era boa pra ele, mas lá não era a sua casa e ele não tinha o mais importante, seus pais... ele nunca falava de sua infância, dizia somente que começou a trabalhar muito cedo ajudando nos afazeres domésticos e depois em fazendas pra se manter na juventude.

Contava papai que tio Osmar, o mais velho dos irmãos, não sabia ler, e com a morte dos pais ele queimou todos os documentos da família sem saber que era importante, diziam os amigos que meus bisavós tinham deixado herança em terras no estado de Goiás mas que naquele momento não tinham como provar por falta dos documentos. Se era verdade não sei, só penso que o destino de todos poderia ter sido talvez menos sofrido se tivessem algo para reconstruirem suas vidas, todos os irmãos juntos.   

Fazendo o curso com a professora Olinda despertei meu interesse por meus avós paternos, mas agora sinto ser um pouco tarde, pois todos os meus tios e papai já partiram para o plano espiritual, vou tentar montar um quebra cabeças conversando com meus primos sobre o que eles sabem da família.

Minha mãe é uma das filhas mais velhas de um total de quatorze irmãos, minha avó tinha um filho por ano, moravam na fazenda, tudo era produzido ali, socavam arroz no pilão pra tirar a casca, faziam horta, criavam animais, os filhos mais velhos cuidavam dos mais novos e da casa, mamãe quase não brincava, mas lembra com alegria das bonecas que fazia com espigas de milho verde, das vaquinhas de manga verde e dos carrinho com lata de leite ninho, esses eram seus brinquedos.

Minha avó cuidava dos outros afazeres domésticos e ia pra roça, ela era filha de indígena, mulher de coração bom, prestativa e de muita fé, vovô era homem sisudo, participou de revoluções, era bravo e sem paciência ate com os filhos.

Mamãe conta que ia pra escola a pé, andava quilômetros e quando chegava lá ainda tinha que ajudar limpar a sala e fazer a merenda escolar, tudo era muito difícil, mal aprendeu a ler e escrever, segundo ela, tinha dificuldade escolar, naquele tempo se dava mais valor ao trabalho do que a escola, e assim as crianças cresciam aprendendo somente o básico, ler e escrever.    

Minha mãe foi preparada pra ser dona de casa, casar e ter filhos e assim aconteceu, quando casaram meu pai tinha 26 anos e ela 16, foram morar em uma fazenda distante, o pai saia para trabalhar na lavoura e minha mãe ficava sozinha em casa, conta que às vezes tinha vontade de voltar pra sua família seus irmãos, lá tinha muito trabalho, mas era bom a casa era cheia de gente.     

A fazenda onde moravam era distante, mamãe passava o dia todo sozinha, a solidão lhe incomodava, a tardezinha ouvia a canto das cigarras e sentia saudade, principalmente dos irmãos bem pequenos que ela cuidava como filho, meu pai vinha almoçar e logo retornava ao trabalho na roça, logo vieram os filhos num total de quatro, me lembro de que gostava de ir pra roça brincar nas pilhas de arroz (pilhas era um monte de arroz com casca pronto para ser batido, ou seja, tirado a casca para consumo).

Nossa família mudou-se para uma pequena cidadezinha para frequentarmos a escola, fomos morar em uma casa bastante humilde construída por meu pai passávamos muitas dificuldades, mas posso dizer que éramos felizes, meu pai contava que eu tinha ganhado um porco do meu padrinho, ele engordou o porco vendeu e comprou uma bezerra, quando a bezerra virou vaca ele engordou e vendeu, comprou o terreno onde construiu nossa casa, eu sempre ficava feliz em ouvir essa história papai foi sábio ao administrar e fazer multiplicar um bem tão pequeno que rendeu bons frutos.

Papai era um homem direito e muito sincero, firme com os filhos, mas carinhoso, aprendeu ler, escrever e fazer cálculo, parecia uma calculadora ambulante, eu admirava essa habilidade que ele tinha, minha mãe era durona, exigente e nervosa, quase não manifestava carinho dava mais atenção a minha irmã caçula e meu segundo irmão.

Quando uma das crianças fazia algo de errado todos os quatro filhos apanhavam, segundo ela, era para os outros não ficarem rindo do que apanhava, me lembro de uma vez quando ela nos chamou para dar bala doce dentro do quarto, quando entramos ela fechou a porta e nos deu uma surra, descontou toda a raiva que havia passado horas atrás.

Meu pai bebia pinga e certo dia (eu tinha uns nove anos) ele chegou bêbado em casa, já era meio tarde da noite, eles brigaram feio, achei até que ele ia bater nela, disse que ia separar dela não aguentava mais, chutou a lamparina, nos deixou no escuro, ouvi minha mãe chorando desesperada, corri acendi a lamparina e fui confortá-la junto com meus irmãos, minha irmã mais nova chorava, meu irmão mais velho esboçava preocupação.

Mantive forte, mas no fundo do meu coração eu sentia medo que a partir daquele momento nos passássemos fome, minha mãe lavava roupa pra fora e ganhava pouco não era o suficiente pra comprar comida, não me lembro muito bem, mas acho que o pai retornou pra casa depois de dois dias e nunca mais saiu.

Anteriormente não me lembro de ver meu pai bêbado, somente a partir desse episódio é que fui percebendo o quanto bebia e o quanto eu sofria com tudo aquilo, ele era um homem bom, honesto e muito trabalhador, mas quando bebia ficava chato e bravo.

Me lembro de rezar pra Deus acabar com as fábricas de pinga, sonhava ter uma família feliz que não se preocupasse com a chegada do pai no final da tarde, ele bebia todos os dias, ah ia me esquecendo de dizer, ele era um excelente construtor de casas.

Diante de tudo o que foi exposto, eu me dou conta que...

Fui casada por trinta anos e tive dois filhos homens, fui feliz os dez primeiros anos, depois somente tristeza, mas mesmo sentindo muita tristeza e às vezes muita raiva do meu marido eu mantive o casamento, eu não entendia o que me mantinha junto àquela pessoa que já não me fazia bem.

Somente agora começo entender, eu fui fiel ao meu pai que teve vinculo de amor interrompido, cresceu sem seus pais, eu não podia deixar meus filhos também sem o pai. Compreendo também que meu marido representava meu pai pra mim, trazia a comida pra dentro de casa, não me deixava passar fome e nem meus filhos,

Tenho minha profissão e ganho razoavelmente bem, mas sempre tive medo de não dar conta e meus filhos passarem fome.

Hoje vejo que fui leal a minha mãe, ela entrou em desespero com medo de não dar conta, eu tive medo de passarmos fome e acabei reproduzindo em meu casamento, dou muito valor em todo alimento e não jogo nada fora, sempre penso naqueles que nada tem para comer.

...Ke sempre prevaleça o Amor em todas okasiões da vida...

MÓDULO 3 – TAREFA DE CONCLUSÃO

RELAÇÕES CONJUGAIS E RELACIONAMENTOS PAIS E FILHOS


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