Meu pai, eu não tenho muitas informações sobre sua jornada e também não consigo perguntar sobre ela. Sinto que existe uma dor muito grande, que me impossibilita até de olhar bem no fundo dos seus olhos, logo tenho vontade de chorar. É papai, o diálogo entre nós, é bem difícil.
O que sei, é que durante sua infância, você residia no interior e provavelmente ajudava seus pais na lavoura. Lembro-me de alguém ter comentado, que meu avô Floriano, fazia uso de bebidas alcoólicas. Eu sinto muito, por não ter vivenciado uma infância e adolescência com mais alegria.
Você sempre conta que quase serviu ao exército enquanto era jovem, por algum motivo, isso não foi possível. Sei que o senhor começou a trabalhar cedo como pintor autônomo e conseguiu comprar dois terrenos. Pois minha avó queria que investisse em algo, para não ficar gastando dinheiro com coisas sem necessidade.
Então, como o dinheiro era bastante controlado para a quitação dos terrenos, você não podia beber uma cerveja enquanto saia para se divertir. Ah, você gostava de sair pra dançar e acredito que tenha sido bastante namorador. O que mais admiro em você, é o cuidado e a gratidão que tem para com sua mãe, minha avó.
Como também ao ótimo pai que o senhor sempre foi a mim e ao meu irmão, nunca mediu esforços para nós ajudar e nós proteger. Gratidão meu pai.
Minha mãe, ah mamãe com você o diálogo flui melhor, mas também é doloroso perguntar sobre sua história de vida. Ao ouvir você contando sobre ela, as lágrimas correm pelo meu rosto e o nó na garganta vem.
Você começou a trabalhar com apenas seis anos de idade, pegando cedinho no cabo da inchada. Você mamãe, não teve uma infância feliz, segundo seus relatos, quando ia para a roça, tinha medo dos tarados, sei que algo de muito ruim aconteceu com você nessa época.
Eu sinto muito, por tamanha crueldade. E como se não bastasse, ainda perdeu seu pai Estefano, para o alcoolismo quando estava entrando na adolescência.
Quanta dor mamãe, eu sinto muito, mas a senhora foi forte e guerreira, que orgulho de você, com apenas 13 anos, saiu de casa para trabalhar em uma cidade desconhecida, para ajudar sua mãe nas despesas da família, trabalhava durante o dia e estudava a noite.
Aos 19 anos, foi residir em minha terra natal, e foi ali que você conheceu o meu pai, em uma tarde dançante. Mas antes do meu pai, aparecer em sua vida, você teve dois grandes amores, que apenas ficaram na lembrança.
Não tenho muitas informações sobre o namoro de meus pais, porém, sei que eu não fui planejada e logo minha vinda a esse mundo causou muita angústia a ambos. Meu pai, não queria me assumir e minha mãe estava decidida em se jogar de uma ponte e acabar com nossas vidas. Meu pai a tempo conseguiu impedi-la.
Foi então que se casaram e estão juntos até hoje.
Os dois se relacionam bem, acredito que se completam. No entanto, durante a minha infância, eu presenciei muitas brigas, e eu sempre pensava como seriam as coisas caso se separassem. Sabe, às vezes sinto que meu pai gostaria de ter aproveitado mais a sua vida, no entanto, ele sabe, que sem minha mãe, não seria quem ele é.
Então, hoje me dou conta que carrego uma lealdade em relação ao relacionamento dos meus pais. Estou com um homem a sete anos, moramos juntos a aproximadamente sete meses e ele se comporta de forma semelhante a meu pai.
Apesar de inúmeras vezes eu demonstrar interesse em usar uma aliança de noivado eu nunca a ganhei. Tenho a sensação de que ele tem medo de responsabilidades, quer aproveitar a vida, estar na presença de amigos, viajar e isso me causa uma insatisfação.
Agora eu sei, por que quando eu era criança, eu tinha medo de homens, eu falava mata o tio. Agora eu sei, o motivo de ter medo de engravidar, de gestar uma criança. Contudo, olho para o início da minha vida intrauterina e digo, tudo bem ter sido assim, está tudo bem agora, as coisas aconteceram como deveriam.
Agora eu tomo a vida e quero sim passar ela adiante, eu quero muito ser mãe, cuidar, zelar, amar, proteger, amparar e claro gestar um novo ser. Dá a luz o que é incrível no universo, a vida.