O ano começou pra mim com uma necessidade enorme de arrumação... Me desfazer do que não serve mais, deixar ir o que não faz sentido e abrir espaço para o que realmente me contempla.
Não é tarefa fácil porque os sistemas coletivos e familiares exercem muito poder sobre nós! Nos dizem como devemos nos comportar, vestir, agir, com quem devemos nos relacionar. Quem merece nosso respeito, nosso amor, o que devemos desejar, nos apegar ou abrir mão. São tantas caixinhas pré-moldadas que ser capaz de responder “o que eu quero de verdade?” é o propósito de uma vida. Já disse e repito, autoconhecimento é um caminho. Sem ele a vida, relacionamentos e escolhas são ilusões.
Comecei pelo do guarda roupa. Desci do maleiro algumas caixas e sacos de brinquedos que minha mãe havia me dado. Ela, na verdade, estava dando para a criança pobre que ela foi, porque eu detestava bonecas e não via graça em ‘brincar de cuidados’. Isso diz muito sobre a relação que nós duas tínhamos.
Quando olhei pra tudo aquilo fiquei pensando: “por que eu estou guardando tudo isso?” A resposta foi indigesta: por lealdade. Eu pensava que, se tivesse uma filha, daria as bonecas a ela. E era como se secretamente no meu coração eu ainda estivesse tentando cuidar da minha mãe e proteger aquelas criancinhas tristes que nós duas fomos. Proteger de todas as faltas de amor, carinho, ternura e cuidado. Tudo representado naquelas bonecas.
A situação começou a se iluminar dentro de mim depois que meu anúncio de doação foi respondido por uma amiga que levará os brinquedos para crianças carentes. Que bonito e emocionante!
Finalmente, mamãe, as bonecas encontrarão seu destino.
Levarão alento e ternura às crianças que as querem, mas seus pais não puderam dar. Gratidão por me deixar fazer parte disso. Eu vou, com a minha menininha toda feliz no coração; e certa de que aquela tristeza de antes já passou, mesmo porque a gente só pode dar o que transborda.
E confiante que sua criança, esteja onde estiver, estará feliz e em paz com isso.