O amor é em essência agregador, provavelmente venha daí sua imensurável capacidade de expansão e realização, um super poder de tal maneira que quem é amado, sente-se empoderado e confiante.
Não usufruir de tal sentimento é ficar à margem dos acontecimentos da vida. Seria como ir ao baile e não ser tirada(o) para dançar e ficar apenas observando os casais bailando na pista enquanto se é tragada por uma sensação de inferioridade típica dos desamados(as) ao ponto de esquecer que bailar sozinha também é uma possibilidade divertida.
No processo de marginalização identifico dois tipos de escassez ou ausência de amor: desamor estrutural e desamor conjuntural.
O primeiro se refere a base, ao amor que deveríamos sentir por parte dos nossos pais na tenra infância. O segundo é circunstancial, forjado durante uma crise ou situação de desafeto, podendo envolver rompimento de casamento, namoro ou amizade, demissão de emprego, enfermidade prolongada, dentre outros desafios impostos pela vida.
Algumas vezes os dois tipos de desamor coexistem e se retroalimentam.
O desamor estrutural é abissal, carece de mergulho profundo para ser tratado, e por acreditar que não temos fôlego suficiente ficamos presas na superfície, subestimando o potencial destrutivo dos ventos que podem nos deixar à deriva. Considero seus estragos os mais difíceis de serem reparados, até porque seu potencial de difusão amplia a possibilidade de cairmos numa relação tóxica e abusiva geradora de desamor conjuntural.
Se o desamor estrutural reside nas profundezas, o desamor conjuntural é a ponta do iceberg de se sentir desvalorizada, não merecedora de afeto, respeito, admiração. Sabe aqueles bilhetinhos assinados com alcunha “De um admirador secreto”? Pois é, quando não nos sentimos amadas, a possibilidade de receber um bilhetinho desse é a mesma de encontrarmos um unicórnio na esquina, ou seja, quase nenhuma.
Vale esclarecer que não se sentir amada pelos pais frequentemente se refere muito mais a forma como interpretamos o amor recebido, do que realmente sobre o amor que nos foi dado. De qualquer jeito, essa percepção vai afetar o modo e a escolha das pessoas com quem nos relacionaremos em nossa trajetória.
Em uma relação abusiva, a ausência de amor é o ponto de interseção entre abusado(a) e abusador(a), ambos estão acometidos de desamor, não conseguem olhar para as suas feridas e nem pedir ajuda.
Se as atitudes abusivas do outro para comigo é porque essa pessoa não foi amada suficiente, quais os motivos que me levam a aceitar esses abusos?
Este estado de dupla miopia emocional acarreta uma visão distorcida de si, do outro(a) e consequentemente da relação. Ocasionando um desvio comportamental, deixando-os a margem do verdadeiro amor, capaz de curar ao invés de adoecer.