Fruto do fado português com a baianidade, esta sou eu.
Em minhas veias correm sangue de colonizadores e colonizados. Ora opressores, ora oprimidos. Ora extravagância, ora miséria.
Vou da alegria à melancolia em questão de segundos. Não é à toa que sou geminiana. Até a astrologia dá respaldo a minha essência e história.
Família de meu pai foi marcada por muita dor. Meu avô, de origem portuguesa, não via alegria na vida, mas só na bebida. Seu carinho era demonstrado pelo material. Em um Natal, ele deu a meu pai um autorama. Eu cresci com o sonho de brincar com esses carrinhos que eram tão importantes ao meu pai. Esse dia nunca chegou...
Minha avó, italiana, tinha em seus olhos azuis um mar de lamúrias; sempre foi dependente financeira de meu avô e se sujeitava às suas agressões quando estava sob efeito da bebida; até que um dia não aguentou mais e resolveu procurar abrigo no colo de sua mãe, seu erro: ter deixado meu pai em casa. Esse abandono, ainda que por pouco tempo, ele nunca esqueceu, também nunca perdoou. Meu pai perdeu o meu avô pra bebida e minha avó pro câncer.
Foi natural a minha maior afinidade com a família de minha mãe. Da Bahia a Minas Gerais, do sertão às terras indígenas. A miscelânea é tamanha que sinto a infinidade que habita em mim.
Não tenho só os olhos de índio, tenho a paixão pela natureza.
As mãos para o tricô e para cabelos são de minha doce avó, ao que passo que enxergo em mim o jeito, a ânsia por justiça, e amor por pães, de meu avô.
O que falar de minha mãe? Impossível descrever em palavras o meu amor e admiração. Acho que por isso levei tantos anos para entender o que havia visto em meu pai.
Minha infância foi marcada por muito amor materno e muita disciplina paterna, cresci com o sentimento de que não era suficiente aos olhos do meu pai.
Esse sentimento de insuficiência me acompanhou por longos anos, até a fase adulta. Demorei para enxergar que ninguém pode dar aquilo que não se teve e não se tem. Sempre quis mudar meu pai e esse sentimento se refletiu em vários namoros abusivos, nos quais não havia reciprocidade.
Chegou um ponto em que parei de tentar mudar meu pai, que passei a aceitá-lo. A partir desse instante muitas vieram à superfície. Qualidades antes ocultas, tornaram-se gritantes. Entendia perfeitamente o que a minha mãe via nele.
Passamos por uma constelação sem saber. Eu consegui aceitá-lo, perdoá-lo, ele fez com que eu me sentisse pertencida ao falar: "tenho orgulho de você". Talvez meus avós nunca tivessem feito o mesmo por ele.
Meus problemas com relacionamentos amorosos não param por aí.
Durante o módulo 1, tive a consciência transgeracional que as mulheres de minha família materna gostam de homens problemáticos. Minha avó foi a segunda mulher de meu avô, um homem genioso, teimoso, também não foi pai amoroso, mas nunca deixou a comida faltar na mesa.
Percebi que aos homens de casa faltava expressão, às mulheres sobrava.
Gratidão a Universo por tamanha percepção. Gratidão aos meus antepassados por tudo, até pelas dores que abriram meus olhos para o melhor caminho a ser seguido.
Dedico este texto ao meu amado pai, que a cada dia se torna melhor aos meus olhos e a minha amada mãe, que é a pessoa mais incrível deste mundo.
Obrigada.