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DA MORTE E DO MORRER

DA MORTE E DO MORRER
Simone Belkis
nov. 27 - 4 min de leitura
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Eu nunca tive problema em falar sobre a morte e nem em conviver com isso. Tinha uma família grande e antiga, era natural que de tempos em tempos precisássemos nos despedir. Não que eu não lamente a perda de entes queridos, mas a morte nunca foi um tabu para mim.

Pode até parecer estranho, uma vez que tenho um transtorno causado por trauma de choque, que ocorre, justamente, pelo risco de morte. Talvez, seja pelo fato de que já estive a ponto de morrer. Mas não vamos tornar esse papo dramático. Quero passar da experiência de falar da morte, para a de experimentar morrer.

Não se preocupem, estou viva. Mas dias atrás perdi uma das pessoas mais importantes da minha vida. Em nenhum momento, transcorridas as duas semanas que passei com meu pai no hospital, pensei que ele morreria. Podia até ser óbvio, mas não era para mim.

Ele lutou, bravamente, contra as sequelas que o coronavírus deixou. O vírus reduziu os seus pulmões a 25%. Eu não sabia disso. Estávamos juntos contando os dias para voltarmos para casa. Quando arrisquei perguntar ao médico se havia a possibilidade de morte e ele, suavemente, disse sim, apenas chorei.

Em outros tempos, desesperei-me diante da ideia dessa perda. Se tivesse ocorrido a um ano atrás, por exemplo, não sei como teria lidado com isso. 

Mas, para minha surpresa, eu continuei ali, fazendo tudo o que me cabia, lutando e brigando com os atendentes para que dessem a ele o seu melhor. E tive que brigar mesmo. Eles estão acostumados, agem como se nada houvesse. Tentando mostrar-se frios ou sendo mesmo, não sei.

Falar de morte pode ser algo muito simples e até fácil, simplesmente porque nos recusamos a encará-la. E nunca será mesmo simples, já que não temos certeza de nada, nem vivos, quanto mais mortos. Mas, é diferente quando se está diante dela.

Eu fiquei com ele até o último segundo, olhando a oscilação das linhas no monitor até que elas simplesmente virassem uma vertical. Não foi bem como é nos filmes, porque após tudo zerar, voltou a acender. A psicóloga explicou que as partes elétricas do corpo ainda duram um tempo.

Acho que o mais importante de tudo foi a forma madura e esclarecida com que consegui lidar com essa perda. Para dizer a verdade, eu entendi isso tudo como o fechamento de um ciclo. Simplesmente, era a sua hora e eu não tinha o direito de querer que ele ficasse. E como consegui isso? Autoconhecendo-me, aprendendo a lidar com a vida, aceitando as coisas como elas são. E sigo nesse aprendizado, essa foi mais uma lição.

Algumas pessoas falavam de suas próprias dores e perdas como se fossem minhas (estavam sendo solidárias) e serei eternamente grata a cada uma delas. Acho que não compreenderiam que estava triste, mas não sofrendo.

Morrer faz parte e não é o fim. Acredito que ainda estejamos um pouco longe dessa compreensão e é provável que algumas pessoas possam me julgar por eu não estar desesperada e deprimida agora.

Eu entendi que a existência é maior que a vida, que meu pai segue existindo em sua real essência e que ele não é mais meu pai. Ele é a essência Divina seguindo seu caminho de ascensão.

 

Nota da imprensa:

https://www.gazetadopovo.com.br/esportes/morre-aos-96-anos-um-dos-ex-jogadores-mais-antigos-de-curitiba/


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