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MINHA VIDA NESTE SISTEMA

MINHA VIDA NESTE SISTEMA
Kellin Daneluz Delai
mar. 16 - 8 min de leitura
010

Me chamo Kéllin, e este nome, que me faz soletra-lo há 40 anos, quem escolheu foi meu pai.

Sou filha do Gilberto e da Cleci Daneluz, nasci e cresci na roça, num lugar chamado Linha Tiradentes, e por assim dizer, um lugar muito lindo e tranquilo. Sou a segunda na ordem de 4 irmãos, o primogênito não nascido e mais dois depois de mim, Keila e Ricardo. Sou muito feliz com meus irmãos, tivemos uma convivência ótima e feliz, sempre nos apoiando e cuidando.

Da minha infância tenho algumas lembranças, mas quando fecho os olhos eu ainda vejo uma criança calada, pensativa e sempre com a mesma angustia. Qual é o meu papel aqui neste lugar, nesta família, neste mundo? Eu tinha uma sensação constante de que não me encaixava no mundo, estava sempre à procura de algo.

Minha mãe sempre conta que fui um bebê que demorou 2 anos para conseguir dormir, eu ficava acordada, sem chorar, e quando o dia amanhecia eu dormia.

No trabalho das constelações familiares as crianças abortadas pertencem ao sistema familiar, mesmo que não tenham se desenvolvido plenamente até o nascimento ou que tenham existido por um pequeno período de tempo. Apenas o fato de terem existido na família configura a necessidade de fazerem parte do sistema, e por isso precisam ser incluídas para que haja ordem e equilíbrio.

Nesse sentido não importa se o aborto foi espontâneo, se foi provocado ou se houve a decisão consciente de fazê-lo. Segundo os preceitos da constelação sistêmica, uma lei natural – a Lei do Pertencimento – não faz julgamento moral. O pertencimento ocorre desde a fecundação e não apenas pelo nascimento.

Essa criança que não nasceu, portanto, só precisa de um lugar na família: o seu lugar, para assim não ser uma “sobrecarga” aos filhos que vierem depois, uma vez que a tendência dos que vem depois é assumir o destino daquele que foi excluído quando esse ato de pertencer não ocorre por parte do casal.

Quando a inclusão não acontece há desequilíbrios no sistema familiar, tanto para o casal quanto para os filhos que precedem. Nesse cenário a ordem do pertencimento dos filhos também será afetada, à semelhança da base estrutural de um prédio, de uma progressão geométrica ou de uma cascata. Em todos esses exemplos existe uma ordem que possibilita a criação de formas harmônicas,

Na minha infância tem alguns eventos que marcaram traumaticamente, como com 4 anos, o dia em que eu cai e perdi todos os dentes da frente, permanecendo durante 4 anos sem dentes. Também com 8 anos, quando fui atingida por um raio durante um temporal, juntamente com o meu pai. Tenho memórias de dor e certeza de que ficaram grandes cicatrizes em mim.

Não tive convivência com meus avós maternos, minha Avó Jacinta faleceu muito jovem, aos 42 anos, após muito tempo adoecida. Faleceu deixando 8 filhos, com idades entre 19 e 1 ano. Os irmãos mais velhos foram cuidando dos mais jovens. Meu avô Victorio faleceu cedo, vítima de infarto. Alguns anos mais tarde, após uma cirurgia, perdi a minha tia Tere, minha segunda mãe e minha madrinha. Essa perda ressoa em minha alma até hoje, uma falta que a gente nunca conseguiu explicar e superar.

Meus avós paternos não viviam juntos, pois meu avô era alcoólatra e desde cedo bebia e colocava a família para fora de casa. Em muitas noites eles precisaram se abrigar nas casas vizinhas. Meu avô Ernesto ainda vive, está com 91 anos, e hoje convive com os filhos. Minha avó Zelândia faleceu há 15 anos. Das poucas coisas que meu pai comenta é que a vó precisava arcar com todas as despesas e criar os filhos sem muito auxilio.

Esta história, em certo ponto, é velada, e meu pai não consegue comentar sobre o assunto.

Desde muito jovem eu tinha sonhos grandiosos, e estes me fizeram sair de casa muito cedo e ir atrás. Eu me formei em fisioterapia, me casei jovem com o Ricardo, com 23 anos, e tive meu filho Arthur com 24 anos. Depois de 8 anos tive minha filha Isadora. E eu sempre segui buscando, me melhorando, melhorando minhas relações, meu trabalho, amizades, família.

Como cheguei a essa formação?

Bem, desde há muito tenho buscado, talvez conhecimento, ou só um sentido para a vida. No ano de 2019, quando se aproximava do fim, eu pensei que talvez para o próximo ano eu devesse desejar ser uma pessoa mais amorosa, e assim o fiz. Na sequência surgiu a oportunidade da formação em constelação familiar.

Desde o início eu me apaixonei pela filosofia e fui a fundo nos estudos dela. Queria experimentar na pratica e também na teoria e logo comecei a pontuar o que poderia estar fora do eixo na minha própria família. Então resolvi fazer um atendimento de constelação, e isso foi um marco importante para um drama familiar.

Em dezembro de 2019 meu papai sofreu um infarto e precisou se submeter a uma cirurgia de 3 pontes de safena. Este período para mim foi talvez um dos mais desafiadores da minha existência até aqui porque eu realmente não aceitava a condição de vulnerabilidade do pai. Foi momento de muito medo, pavor e que me levou a adoecer também.

Sair dessa pressão significa voltar para o lugar e muitas vezes voltar ao lugar nos faz perder a importância, nos tira do lugar de salvadores. Aceitar isto é uma das maiores dificuldades que o nosso ego no impõe.

Estar no nosso lugar é ver também os limites que existem na própria vida, e também na vida das pessoas que amamos. É estar consciente que mesmo amando alguém pouco podemos fazer por esta pessoa, pois só ela pode ser a protagonista de sua vida.

É aceitar o sofrimento do outro e ajudar de um lugar possível, se for possível. E aprender a lidar com a realidade e a forma como ela se apresenta. De forma concreta, sem fantasias.

Assim como filhos, por exemplo, nos cabe muitas vezes olhar para o sofrimento dos pais e aceitar que ele existe. Ou mesmo para o sofrimento de um irmão ou irmã.

Nós somos, em boa parte da nossa vida, impotentes perante o destino dos outros. E por mais que amamos, nossa capacidade de ação é bastante limitada.

A partir daí precisei andar numa tênue linha entre ir para o meu lugar no sistema e aceitar o destino de cada um. Eu cheguei a cogitar que não seria possível seguir com a formação e parei de estudar, de ler. Porém, entendi que o desejo da minha alma era maior e eu fui em frente. E todos os fatos, no fim, queriam me levar a um só lugar, o meu! Que movimento grandioso esse de se tornar pequena, de ser somente a filha, a segunda filha, não mais a primeira.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Há um antídoto para tudo isto, reconhecer o nosso lugar e permanecer nele, assumindo o que é bom e o que é difícil que surge a partir disso.

Quando faço isso, o peso que eventualmente surge em nossas costas é possível de ser carregado. É um peso que não interrompe o caminhar.

No meu lugar encontro força para lidar com tudo o que é difícil e que me pertence.

Quantas vezes eu precisei dar um passo atrás, voltar algumas casas no jogo da minha vida, ocupar o meu lugar, mais atrás, mais pequena. Isso! Minha querida alma, agora eu me vejo, e pequena que sou estou completa.


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