Todos nós somos passíveis de cometer erros.
Geralmente nossos erros afetam a vida de outras pessoas. Todos os erros geram consequências que muitas vezes, inclusive, não podem ser percebidas imediatamente. É um equívoco pensar que podemos perdoar alguém se entendemos o perdão como algo que livra o outro da responsabilidade pela consequência do que fez. Perdoar, nesse contexto, é um ato de arrogância, pois aquele que perdoa toma para si a ilusão de que pode eliminar as consequências do ato do outro através do seu perdão. Essa posição de superioridade priva o agressor da alternativa de crescer através do próprio erro, e pode gerar consequências nefastas para as próximas gerações.
Em um diferente entendimento do perdão, podemos deixar com o outro a responsabilidade pelas consequências do que fez, e assumir a consequência dos nossos próprios atos. Muitas vezes alguém faz algo de mau para nós com a nossa permissão inconsciente - em alguns casos como resultado de um emaranhamento. Por exemplo, uma mulher que nunca consegue separar-se de um homem abusivo pode estar permitindo o abuso por amor e lealdade a uma avó que também teve um homem abusivo. Há, portanto, muitos possíveis motivos ocultos para que os agressores estejam agressores e as vítimas estejam vítimas.
O mundo dividido entre bons e maus ganha força através do perdão que não enxerga toda essa totalidade. Todos nós temos nossa parcela de responsabilidade na relação com o outro. Quando nos damos conta disso, por amor, paramos de querer perdoar e olhamos a realidade com a clareza que ela exige para que possamos nos tornar mais capazes de lidar com ela.
Se repararmos bem, o perdão também tem o papel de nos aliviar da nossa própria culpa. E muitas vezes isso não dá certo, porque em diversos casos esse perdão que toma para si um direito que não tem, joga também para o outro toda a responsabilidade pelo que aconteceu. Olhar a vida dessa maneira nos torna, com o tempo, fracos e desconectados da realidade. Esse é um movimento para o menos.
Na prática, quando dizemos ao outro "desculpe-me pelo que fiz a você", nós não só estamos fazendo um pedido que está além do que a "vítima" pode realizar, como também estamos atribuindo a ela a responsabilidade de nos livrar das consequências dos nossos próprios erros. Para a vítima, esse é um peso a mais. Esse pedido de desculpas mantém o conflito, pois não respeita o equilíbrio de trocas, fundamental nas relações humanas. Se, no entanto, o perpetrador diz: "Eu sinto muito", ele abre um espaço interno em que ele mesmo pode crescer através do acolhimento da sua própria responsabilidade e culpa. Ao mesmo tempo em que ele cresce, ele pode também deixar o outro livre para assumir sua eventual responsabilidade. Só assim o campo se abre de forma a permitir que os dois possam negociar uma compensação justa que traz de volta a dignidade e a força dos dois e, junto com isso, a paz. Esse é um movimento para o mais.
Bert Hellinger observa que podemos seguir leves nas nossas relações se praticamos a indulgência, ou seja, permitimos internamente que o outro cometa erros e viva em plenitude a sua imperfeição e busca. Só podemos fazer isso na medida em que nós, também, nos damos essa permissão interna, e olhamos de forma amorosa para as nossas próprias imperfeições. Nesse contexto, já não precisamos mais perdoar, pois os erros são vistos como possibilidades de crescimento. Com TODAS as suas consequências e com toda a grandeza que isso envolve.
Leo Costa