Eu estava esparramado entre os milhares de processos que povoam a minha sala. Os processos de papel, se bem aproveitados, também germinam violetas. Basta esmigalhar o processo, misturar com terra fofa, acrescentar minhocas, deixar madurar e depois, jogar as sementes.
As violetas crescerão direito entremeio a linhas tortas, iguais a Deus. Estes desejos me peregrinam. É um empobrecimento pensar que o processo só serve para fazer justiça. Eles também se prestam a estas inutilidades encantadoramente lindas. Não tenho certeza se os processos eletrônicos terão esta preponderância de terra, minhoca e flor. É difícil germinar o nada.
Nestes tempos bochosos de outono, fui assinando as centenas de processos, pequenos projetos de violetas. Todos eles analisados e pensados pela Elisangela, a Laura e a Rafaella.
Bochosos por causa das bochas de pinhão. Nesta época do ano, as bochas e os seus pinhões estão aí para engrandecer as chapas dos velhos fogões a lenha. O velho fogão da minha mãe era uma relíquia. Ele derreteu por conta de uma lenha de angico vermelho que o meu pai colheu no mato. Só de pensar, sinto o gosto dos pinhões tostados na chapa. As parreiras desnudaram as folhas. Os caquizeiros e os plátanos se vestiram dourados de amarelo.
Estes pensamentos malucos disputavam espaço em minha mesa quando, de repente, um parágrafo, escrito pela Leonice, assistente social judiciária, me fez parar:
“Ambos expressam o quanto a sua vida mudou com a chegada do filho. O pai refere 'agora é outra vida, me sinto outra pessoa desde o dia em que o juiz me chamou para buscar meu filho'. Ambos se comovem ao falar do bebê”.
Li de novo. Reli para as gurias. Quase chorei de tão simples.
A assistente social relatou que a família vive entre parreiras, pinheiros e caquizeiros. O homem vai para a roça, mas não vê o momento de voltar para brincar com o filho. Agora é outra vida. Planejam comprar um carro para levar o filho à escola. Não é preciso ter carro para adotar.
Texto de Mario Romano Maggioni.