Conteúdo autoria: Olinda Guedes
Realizado em Guarapuava dias 05/10/19
Para alcançar o coração do outro, é preciso rapport, empatia, elegância e humor. Em todo trauma, o indivíduo passa por um momento de solidão, sente-se desprotegido. Todo esse quadro são memórias traumáticas transgeracionais de identificação com a vítima exatamente durante o processo de quase morte. Estes movimentos que chamamos de síndrome do corpo inquieto, inclui as pernas inquietas, os braços e ombros, a cabeça, todo o corpo fica inquieto.
A Síndrome do Corpo Inquieto, carrega as mesmas memórias da convulsão num grau menor. Do ponto de vista médico, esta síndrome é tratada com algumas medicações que também são usadas para tratar convulsão.
A Epilepsia é a memória do medo, do medo intenso, enquanto que a convulsão é a memória da luta entre vida e morte.
A gagueira também é uma expressão de loucura. É o corpo aqui e agora, é uma memória pessoal ou transgeracional de ameaça à vida, sendo reexperienciada. Fica totalmente esquisito, porque a pessoa está calma, vai só partilhar algo e a fala sai entrecortada. Então nós podemos imaginar a vítima ao se deparar com a sensação iminente de morte pedindo socorro ou a voz sai como um grito. Por isso tem pessoas que parecem falar normal, mas gritam. É uma identificação com a vítima pedindo socorro, mas também a fala entrecortada. O instinto de luta, de enfrentamento e de fuga para sobreviver, é o medo presente. É de conhecimento geral que mesmo que a pessoa tenha uma gagueira num grau severo, quando ela canta, a gagueira desaparece. Então o que acontece é que todo corpo de dor desaparece, quando ativamos o nosso estado de presença. Canto e pranto são irmãos, voz e emoção são duas faces da mesma moeda. Ao cantar, o organismo entende que ele está seguro e protegido, que ele pertence, que ele é amado, que ele é amado de graça, mesmo que isto envolva remuneração, mesmo que seja um cantar profissional. Porque o seu coração sabe que não são as moedas que fazem tão incrível o seu canto e que ao mesmo tempo, não há dinheiro que pague a sua sensação de liberdade ao cantar. São sensações incríveis e quando estas comunidades de destino se encontram, esses cantores se tornam profissionais e referências mundiais, mobilizando multidões. Um ídolo e seus fãs são grandes comunidades de destinos, tal qual um líder espiritual e seus seguidores. Isto salva muitas vidas. A manada salva... quando a família coloca em risco, a manada salva. Quem carrega de maneira intensa as memórias de orfandade, precisa encontrar uma comunidade.
O soluço também é uma memória traumática de não poder mostrar a própria dor, de não poder pedir amparo, proteção. Quem engole o pranto, soluça. É comum pessoas que carregam memórias intensas de tristeza durante a vida e que não tiveram consolo, na hora da morte, soluçar. A forma como se nasce, determina como viveremos. A forma como se nasce determina a vida, o modo pelo qual morremos, revela a nossa vida.
E é a partir destes engramas, destas experiências, destas memórias, que nós prosseguiremos. Algumas religiões chamam estas próximas etapas de umbral ou purgatório, de inferno e de céu. Portanto, nós percebemos pessoas que aparentam ser céu, ainda como crianças, porque o seu sistema anterior já trabalhou tanto, tanto que esta pessoa já está livre. Outras pessoas ainda fazem tanto para os seus sistemas, que algumas vezes elas têm a sensação de que não vão suportar as noites escuras, o purgatório. A maioria de nós estamos ali, porque na maioria dos sistemas, nós somos a primeira geração consciente, às vezes no máximo a terceira e ainda existe um tanto que ainda estão aquém de nós nos presídios, nas psicoses, nas favelas, em grandes comunidades de destino, inferno...
Alguns filhos nascem tão livres, que já são consideradas crianças cristal, mas esse movimento já começou há algum tempo, pelo conhecimento curando, com o advento da psicanálise, de outras psicoterapias, com o reconhecimento da filosofia, com a inclusão das artes. Então começaram a nascer crianças diferentes que nós chamávamos de “crianças índigo” e hoje eles cresceram e já têm por volta de 40 anos. Nem sempre uma pessoa com a sua consciência evoluída, consegue ter filhos livres, porque aqui nós temos não só a influência pessoal como a epigenética. A cada um de nós é dado um destino e aqueles que carregam sofrimento foram sorteados com uma configuração de tarefas que ainda estão em aberto no sistema. Por isso é um traço de pessoas superdotadas, a empatia e o senso de justiça social.
Quando decidimos ter um filho, nós enfrentamos todos os nossos medos, um filho muda as nossas vidas, os bons por vezes, carregam tanto medo que eles excluem e excluem tanto que torna-se um direito em muitos países excluir. Por exemplo, no Brasil há algum tempo foi sancionada uma lei, onde a mulher cujo filho não foi concebido de uma relação consentida, pode interromper a gestação, ou uma mãe cujo bebê é diagnosticado “especial”, até algumas semanas, tem o direito de interromper esta vida. E nós sabemos que todos somos livres acerca do plantio e do cultivo, mas não sobre os frutos, não sobre a colheita.
O medo que atua sobre alguns sistemas ou que algumas mulheres carregam, de que um filho não seja perfeito, é a memória de segredos em relação a diversos crimes. Algumas mulheres ao ter um filho no ventre, são acometidas por estranhos sofrimentos. Por exemplo, o medo de que o bebê cresça sem perna ou sem olho e aí elas correm para o médico e fazem outra ultrassonografia e conferem se está tudo bem e elas respiram aliviadas, mas as constatações não são suficientes para resolução desses segredos.
Quem sofre de lúpus, carrega memória transgeracional de ataques coletivos que culminaram ou não em genocídio. Portanto os medos das mães precisam ir pra terapia. Os medos das mães são os segredos sistêmicos indo à tona.
O único modo que nós temos de ajudar nossos filhos a realizar as suas histórias, a cumprirem os seus destinos é dizer: Eu os tomo, exatamente como são, com tudo o que carregam. O fato de um adulto de um sistema ter qualquer sintoma não significa absolutamente nada perante as tarefas que nossos filhos carregarão, porque quando nasce uma criança, nasce uma esperança.
Por vezes um antepassado cujo destino foi morrer de fome e depressão, apesar de toda luta, tem neste descendente um milagre, o que torna completo, o que cura. Nasce uma criança, nasce uma esperança. Talvez esse descendente precisa fazer um pequeno trabalho em relação ao sobrepeso, mas isso não é nada perante todas as coisas incríveis que ele faz. Desde cedo torna-se um empreendedor social, gera riqueza, gera prosperidade pra sua família, para a família dos funcionários, pras empresas dos fornecedores. E lá atrás aquele trisavô sorri feliz dizendo: “finalmente”, e este descendente diz: “querido antepassado, grato por tudo, o essencial vocês nos deram e agora tudo o mais nós podemos fazer, inclusive recuperar a prosperidade.” Deste modo é possível que um relacionamento entre pais e filhos dê certo, quando os pais sabem e trabalham os seus medos de modo que eles não tenham medo. De modo que eles possam dizer até mesmo muito antes de gestar: “você é o filho certo para nós.” E então, milagres incríveis acontecem. Às vezes começam dentro do ventre. A inclusão faz milagres e os geneticistas sabem que muitos diagnósticos em vida intrauterina vão totalmente abaixo, depois que os bebês nascem, às vezes até antes de nascer. Eles chamam isso de emissão espontânea ou erros de diagnóstico, mas nós chamamos de milagres. Milagres são sempre a exceção à regra.
Aos pais adotivos deveriam ser concedidos os mesmos deveres dos pais biológicos. Eles jamais deveriam ter o direito de escolher os seus filhos. Por isso que as adoções estrangeiras são muito mais bem sucedidas do que as adoções nacionais. Mesmo aqueles pais, tomando como filhos, pessoas excluídas. Os mais velhos, os negros, os grupos de irmãos, os com história de estupro ou os deficientes. Aquele que recebe amor de graça, torna-se um fiel aliado.
Estes milagres que nós observamos no mundo biológico, de diagnósticos totalmente diferentes depois de algum tempo, que a medicina não explica, acontece o mesmo no mundo adotivo e até um tanto mais. Nos nove primeiros meses muitos diagnósticos caem por terra mesmo que a criança já seja grande. Mesmo crianças que convulsionam, deixam de convulsionar, crianças com dislexia severa passam a escrever, crianças que não caminhavam até 9 anos, passam a caminhar. O amor de graça faz milagres. Uma criança muda nossas vidas. Onde não há amor de graça, os milagres não podem acontecer. O amor de graça é o caminho para os milagres.
As compulsões mostram memórias de medo dentro do sistema. Toda compulsão, mostra que houve naquele sistema ameaça à vida. Todo comportamento por natureza é uma forma de manter o corpo vivo. Por meio de movimentos, por meio de tarefas, de ações. Cada compulsão mostra a especificidade do trauma. Numa família onde houve morte por intoxicação, por envenenamento, o transtorno obsessivo compulsivo será por limpeza. Quando houve injustiças em relação à propriedade, a pessoa pode ter mania de comprar ou mania de roubar. Existem alguns TOC’s que são movimentos corporais. Por exemplo, a pessoa só conseguir comer depois que bater na perna 3 vezes ou a pessoa manter-se em contato social se ela bater no queixo e no rosto. São memórias específicas de medo, daquilo que não só ameaçou, mas também daquilo que salvou. Portanto, compulsão e TOC’s têm cura à medida que a memória traumática for acessada dentro de um contexto terapêutico, para que se possa informar ao sistema, que já passou, que tudo já está bem agora. Ao vivenciar de forma terapêutica o efeito traumático, todo o organismo, todo o sistema reorganiza todas essas memórias, como passado. Só o que é passado, passa. O que está congelado, fica presente. O que é experienciado pode tornar-se passado.