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A INFÂNCIA QUE MORA EM CADA UM DE NÓS

A INFÂNCIA QUE MORA EM CADA UM DE NÓS
Claudete Hoffmann Lamour
nov. 3 - 9 min de leitura
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Módulo III - Relacionamento conjugal e entre pais e filhos

A infância de nossos pais, de nossos avós, de nossos bisavós, enfim de nossos antepassados, moram em nós” (Olinda Guedes).

Minha história começa anteriormente com meus ancestrais, mas meu relato inicia com a vida de meu pai. Sexto filho, de nove irmãos, meu pai nasceu em uma pequena cidade no interior de Santa Catarina, no ano de 1939.

Teve uma infância dura, seu pai era alcoolista e por muitas vezes se tornava violento, o que provocava medo e tristeza em todos os familiares. Além disso, assim como seus irmãos, ainda pequeno teve que trabalhar para ajudar no sustento da casa, que provinha da agricultura familiar e mais tarde, da moagem de grãos que se “transformavam” em farinha.

Ainda pequeno, mudou-se com a família para o Rio Grande do Sul e seu pai comprou as terras dos pais de minha mãe. Meu pai não tem lembranças de brincadeiras realizadas na infância, somente a partir dos doze anos aproximadamente, quando se interessou por esportes com bola, em especial o futebol, paixão que o acompanhou por toda a vida.

Isso aconteceu, ao ingressar no seminário, uma vez que naquela época era a única maneira dos meninos seguirem com os estudos.

Aos onze anos de idade, viveu a dura experiência de perder uma irmãzinha, de três anos de idade, tendo como causa de morte a difteria. Essa dor se repetiu exatamente dez anos depois, quando em 1960 perdeu outra irmã, que aos 28 anos de idade e doente, não conseguiu levar a gravidez de sua quarta filha a término, falecendo um dia após a sua pequena.

Cresceu com a presença de sua mãe protegendo os filhos como conseguia e demonstrando seu carinho através do preparo de seus pratos preferidos como a sopa de batata ou de leite, a cuca recheada e o sagu com creme. Com ela, também aprendeu amar as flores, cultivar jardins, árvores frutíferas e tomar chá natural.

Com o seu pai, aprendeu o gosto pela leitura. Vovô era um grande leitor, assinante de revistas e do Jornal Correio Riograndense. Isso por sua vez, acabou despertando o gosto pela leitura em praticamente todos os seus filhos.

Apesar desse desejo de aprender sempre mais, papai estudou apenas até o quinto ano, devido as dificuldades ao acesso à escola em pequenas cidades do interior.

Desde jovem, foi um grande líder comunitário, sempre preocupado em ajudar os menos favorecidos. Iniciou na política muito jovem, sendo eleito vereador pela primeira vez aos 19 anos, função que exerceu por mais uma vez, assim como a de prefeito. Nas duas cidades em que morou, ajudou a fundar o Sindicato dos Trabalhadores Rurais.

Escrevia com fluência, argumentava como ninguém e assim seguiu, sendo a voz daqueles que a ele confiaram essa missão.

Minha mãezinha por sua vez, nasceu no Rio Grande do Sul em 1941, foi a 12ª de quatorze filhos, nascendo 17 anos depois de seu primeiro irmão. Cresceu numa família religiosa, meu vovô foi cantor no coral da igreja e também tocava instrumentos musicais, assim como seus filhos homens.

Desta forma, na casa dos meus avós maternos, os finais de semana sempre tinha música, dança e muita alegria. Foi nesse ambiente familiar de animação e união que minha mãe cresceu. Ela tinha muito respeito por seus pais e desde pequena, a exemplo de seus irmãos, sempre ajudava nos pequenos afazeres da casa e da roça.

A primeira língua que minha mãe aprendeu foi o alemão e até os dias de hoje, carrega um grande sotaque na sua fala. Perdeu três irmãozinhos pequenos, porém, dois deles não chegou nem a conhecer.

Minha mãe estudou pouco, até o quarto ano primário. Naquela época, era só o que tinha na vila onde morava e somente os meninos poderiam ir para outras cidades estudar em seminários.

Ao contrário de papai, minha mãe lembra com alegria das brincadeiras que fazia na infância: boneca, casinha, pega-pega, balanço amarrado na árvore, bolinha de gude, caçador, andava a cavalo, brincava no potreiro... Adolescente, assim como as outras irmãs, aprendeu a bordar, costurar, cozinhar.

Meus pais embora já se conhecessem desde criança, se interessaram um pelo outro, nos jogos de futebol: meu pai jogava e minha mãe era torcedora.

Meus pais namoravam pouco tempo; quando minha mãe se mudou com a família para o interior do Paraná, meu pai continuou no Rio Grande do Sul e o namoro seguiu por cartas até que decidiram que seriam parceiros para vida.

Casaram-se em 1961, e nos próximos dez anos, tiveram cinco filhos, sendo eu a quarta deles. Os partos de minha mãe foram todos em casa, com ajuda de parteira. Meu pai sempre esteve presente segurando a mão de mamãe. A vida para eles foi por vezes bastante dura. Viveram uma parte dela, do sustento daquilo que produziam na roça e com a criação de alguns animais.

Mais tarde, meu pai, acabou repetindo aquilo que tanto condenava em seu pai. Também começou a beber e assim o fez por mais de trinta anos. Muitas marcas ficaram na memória de todos nós, seus filhos. Mamãe sofreu muito, mas nunca desistiu de meu pai.

Hoje posso dizer com alegria que há 17 anos, papai não bebe mais. Fora isso, seguiram uma vida de companheirismo que esse ano completou 60 anos, acordam cedo para tomar chimarrão, sempre que possível reúnem os filhos e amigos em sua casa, rezam juntos todos os dias e compartilham as alegrias e frustações do mesmo time de futebol, cujo jogos ouvem juntos.

Eu nasci numa pequena cidade no interior do Paraná, em meados de 1968. Cresci com uma saúde frágil, mas sempre aos cuidados de meus pais. Minha mãe sempre foi aquela que dava conta de tudo: casa, filhos, marido. Se desdobrava e sempre fazia o melhor por todos nós.

Meu pai, assim como aprendeu com o seu pai, também era assinante de jornal e revista, comprava enciclopédias e coleções de histórias infantis para nós lermos. Com ele, aprendemos o gosto pela leitura.

Na nossa casa tinha uma regra: todos os filhos deveriam cursar pelo menos até o ensino médio. Hoje se orgulha muito dos filhos e três deles seguiram com os estudos: uma com especialização, um com mestrado e uma com pós doutorado e professora universitária.

Minhas memórias da infância são um misto de alegria e dor. Nas primeiras, as brincadeiras na rua em dia de chuva, na casa dos amigos, na casa da vovó, das noites de Natal que eram muito especiais, das comidas deliciosas, das casinhas feitas em árvores, das brincadeiras de esconde-esconde dentro do paiol, dos doces comprados no armazém, das figurinhas do Zequinha, das balinhas de melado feitas por mamãe.... que doces lembranças.

Mas, também ainda moram em mim, embora agora um tantinho menos, as memórias de medo e tristeza. Medo de algo ruim acontecer, medo de meu pai machucar minha mãe ou ele próprio se machucar, medo da mãe abandonar meu pai. Tristeza ao ver minha mãe chorando, de ver meu pai tão vulnerável. Impotência em não poder fazer nada para mudar aquela situação.

Hoje aos 53 anos de idade sigo aprendendo sobre os conhecimentos sistêmicos, cuidando e curando a minha criança interior.

Ao dirigir um olhar mais cuidadoso para minha infância, vejo que ela foi a mistura da infância dos meus pais. Por um lado, foi parecida com a de papai porquê de certa forma, vivemos as mesmas dores em relação ao alcoolismo daquele a quem tanto amávamos e o medo de vermos nossas mães feridas, física ou emocionalmente.

Por outro lado, assim como mamãe, aprendi a amar a Deus, vivi muitas alegrias, brinquei com meus irmãos e amigos, tive a liberdade de crescer sem muros. Com meus pais, despertei o desejo de viajar, de conhecer os lugares e principalmente de estar junto a natureza.

Estou com meu marido há 30 anos, somos muito diferentes assim como nossos sistemas familiares. Mas, como diz a querida Olinda Guedes, cada pessoa que atraímos para nossa vida vem para curar ou melhorar algo em nós.

Temos um filho que recentemente completou vinte anos de idade e é nossa alegria. Sempre o tratamos com muito amor e respeito e assim como nossos pais, do nosso jeito, procuramos dar a ele aquilo de bom que também tivemos.  

Sigo desejando que todas as pessoas consigam olhar para sua criança interior. Que a criança que habita em nós seja sempre respeitada, tratada com carinho, mimada, cuidada, amada, acolhida. porque como aprendemos com Olinda Guedes, todos nós precisamos voltar pra casa. Desta forma, estaremos também curando as crianças do nosso sistema familiar que moram em nós.

#mod03

 

 

 

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