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CARTA AOS ANTEPASSADOS

CARTA AOS ANTEPASSADOS
Maria Célia Pexe Plens
abr. 22 - 6 min de leitura
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Queridos antepassados,

Que privilégio estar nesse campo tão miscigenado: indígenas, africanos e portugueses do lado materno, e italianos do lado paterno.

Que riqueza.

 Culturas tão diferentes se integrando e combinando para que a vida continue e chegue até aqui.

Vejo a todos.

E como numa fotografia imaginária onde se posicionam atrás de mim, imagino semblantes alegres e sinto a força de mãos fortes me abençoando.

Recebo com alegria e gratidão essa benção que me fortalece para a vida.

Sou grata a cada um e a cada uma de vocês e os honro exatamente como são.

Sei que cada um e cada uma, a seu modo, deu o melhor de si para cumprir o seu destino e garantir a perpetuação da vida.

O pouco da história que me chega e que consigo reconstituir é suficiente para imaginar, o quão determinados e determinadas vocês foram.

Homens e mulheres corajosos, que movidos pela força da vida, e na intenção de protegê-la, moveram céus e atravessaram mares, literalmente.

Fico a pensar no estarrecimento enfrentado pelos trisavós indígenas ao se depararem com os conquistadores de sua terras, subjugando sua gente, destruindo seus pertences, aniquilando sua gente e seu modo natural de viver.

Sei que muitos de vocês abdicaram a vida linda integrada com a natureza para se adaptar a condição de civilizado.

Inúmeros sucumbiram depois de resistir bravamente a destruição de suas habitações, de tudo que lhes era vital e precioso.  

Para incontáveis, dentre os que conseguiram sobreviver, a tristeza foi tamanha que trouxe a morte precoce.

Quanto aos antepassados africanos, a história coincide em níveis de crueldade e sofrimento.

A história diz que, muitos de vós, em vossa terra natal, pertencíeis grupos prósperos, sábios, nobres.

Em muitos casos, foram capturados pelos próprios conterrâneos para serem tornado escravos.

É inimaginável reconstituir como se dá o desterro, o transporte nos navios negreiros.

Mercadoria?

Animais?

Depois o desembarque, o comércio.

A vida nas senzalas.

Os europeus, no caso, portugueses e italianos, no aparente do aparente, vocês escolheram encarar uma nova terra, que se lhes apresentava como uma boa possibilidade de arrumar a vida, crescer, prosperar financeiramente, e talvez até retornar à europa.

Se nos reportarmos apenas aos portugueses, os desbravadores das terras ameríndias, os catequizadores dos nativos, ou os que civilizaram os indígenas.

Um pouco mais a frente no tempo, capturavam, transportavam e comercializavam escravos negros africanos ou os adquiriam através do comércio aqui no Brasil.

Para os Italianos, um dos motivos para a escolha pela aventura americana, foram necessidades impostas por guerras internas pela unificação do país, que aumentou as dificuldades de sobrevivência das famílias nas pequenas propriedades.

A emigração de milhares de italianos para o Brasil e outros destinos foi intensamente estimulada, sendo financiada pelos governos.

Imagino como homens, mulheres e crianças encararam corajosamente os desafios do alto mar e as incertezas da nova terra.

Sei que tem quem ficou no caminho sendo sepultado em alto mar.

E quem nasceu durante a viagem.

O desterro foi frequente na história de todos vós, e vivido de diferentes formas nos diferentes grupos.

Indígenas forçados a deixar suas terras para adentrar terras mais interiores, ou integrados, a força, à cultura do dominador.

Africanos capturados, dominados, expatriados escravizados.

Para os europeus o desterro foi disfarçado de liberdade. 

Puderam escolher.

Para todos, sofrimento e dor.

Quanta dor.

Um grande corpo de dor.

Dor da separação, da partida, dor da perda de vínculos com pessoas queridas e com a terra natal.

Dor da perda de um jeito particular de viver.

Dor da morte em si, e da morte para si.

Eu sinto muito.

Mas a vida brota das insignificantes faíscas de amor escondidas nestas noites escuras.

Nesse corpo de dor.

Forças ocultas vão se organizando, se combinando, se multiplicando, se equilibrando, tomando forma.

No contexto acima, perpetradores e vítimas se encontram no mesmo plano. Quem diria. 

Um bisavô português escravocrata toma por esposa uma índia cativa pega a laço. Desse relacionamento, nascem dentre outros filhos e filhas, meu avô materno, José Arantes, que se torna órfão de pai na infância e cresce com filhos de ex-escravos da família.

De outra parte, um senhor, também português abastado, escravocrata toma uma mulher escrava e com ela constitui e mantém uma família paralela à sua família oficial.

Sobre esse assunto pouco se comenta entre os familiares, mas eu soube que esse era um costume comum entre os homens de honra na época.

Dessa união paralela nasce minha avó materna, Nelsina Borges, uma mulher doce e meiga que carrega, dentre tantas, e de forma velada, a responsabilidade de garantir o branqueamento da família.

E o faz com determinação.

Após um relacionamento frustrado de mãe de um filho, casa-se com vovô.

Segredos?

 Ah!

São muitos!

Mas a função deles é apenas assegurar a vida.

Que linda história mamãe!

Sinto orgulho de todos vós.

Papai querido, um pouco da sua história mencionei ainda há pouco.

Vovô Pedro Pesce e vovó Rosa Risse (Rosina).

Embora nascidos no Brasil, vossa memória da Itália parece real.

Falavam desse país e de sua gente como se  tivessem estado lá.

Falavam das viagens nos navios como se tivessem feito essas viagens pessoalmente.

Cantarolavam canções em italiano, mesmo sendo proibidos de falar na língua de origem.

Lembro-me com clareza do brinco que vovó trazia na orelha.

Com orgulho e gratidão, fazia questão de nos informar que veio da Itália.

Sua avó havia mandado de presente por seu nascimento aqui no Brasil.

Gratidão a todos e a cada um!

Abro meu coração para acolher cada um de vós, exatamente como são.

A todos minha reverência e meu amor.

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