Queridos antepassados.
Poucas sãos as histórias que ouvi sobre vocês, contadas pelos meus avós, tios, pais, de onde vieram, as dores que carregaram, incertezas que viveram.
Sei que, a vida não foi fácil, a labuta rural, muitos filhos e sem descanso. Também sei que, os meus pais se casaram muito jovens, aos 18 anos, e desde a infância já precisavam lidar com as responsabilidades da vida adulta.
Um irmão criava o outro enquanto o pai e ou a mãe trabalhavam para o sustento da casa.
Na minha vida, carrego essa garra de vocês, essa luta pela sobrevivência. Também precisei ser a figura materna para o meu irmão mais novo já que meus pais trabalhavam o dia inteiro e chegavam apenas a noite.
Hoje compreendo muito do comportamento dos meus pais conosco. Comigo e com meus irmãos. Não é justo cobrar de quem não recebeu. E sei que fizeram tudo o que puderam, chegaram aos seus limites para dar o seu melhor. Eu os honro, vejo e os respeito.
Agradeço por toda a trajetória que conheço e tentarei descobrir o que ainda não tenho conhecimento. Guardo memórias maravilhosas da convivência com meus avós e sou muito agradecida por ter convivido com vocês.
O amor construído jamais sairá de mim. Faço questão de tê-los no meu dia a dia como guias. Sempre que cozinho lembro da minha avó paterna e das minhas tias que são cozinheiras de mão cheia.
Quanto às minhas raízes, sei que meu avô era filho de índia e que a minha bisa foi encontrada na mata, perdida. Meu biso a encontrou e a amparou.
Não houve captura, mas, sei que precisou se adaptar a um estilo de vida urbano já que vivia na mata e imagino o quanto deve ter sido dolorosa a sua adaptação a uma nova cultura .
Quero dizer que hoje eu os vejo. Não existe mais essa busca incessante pela sobrevivência. O pior já passou. As longas distâncias que precisavam ser percorridas a pé não existem mais.
A vida é mais prática, hoje. Não há mais fome.
Agradeço a vocês por terem existido, aos que conheci pessoalmente ou por histórias contadas. Aos que sei o nome e aos que não sei.
Agora eu os liberto de toda dor, de toda culpa, de todo rancor, desamor e de qualquer outro sentimento que os prenda ao sofrimento.
Carrego de vocês a garra, o partilhar, o amparar, o ouvir , o cuidar, o aconchegar.
Agradeço imensamente e me despeço de todos, os vistos e os não vistos, com muita gratidão, libertação e amor.
Agora, todos vocês estão em seu devido lugar, a ordem foi restaurada.