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NOITES ESCURAS DA ALMA

NOITES ESCURAS DA ALMA
Marisa Baldessar
mar. 19 - 7 min de leitura
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Este módulo é encantador, ao mesmo tempo que é triste, pois nos remete a nossas noites escuras da alma.

São tantas, não percebemos o quanto nós vivemos nas noites escuras até assistir este módulo.

A pior e mais terrível noite escura da minha alma:

Minha pequena Kamila adorava ir ao sítio dos meus pais, lá haviam muitos animais onde ela passava o dia se divertindo.

Minha mãe sempre diz que se quisesse encontrar a Kamila deveríamos ir onde estavam as dezenas de galinhas, pois lá ao centro ela estaria com espigas de milho. 

Ela era a alegria dos meus pais.

Era um sábado 11 de abril, sábado de aleluia, assim nos referimos ao dia da ressurreição de Jesus Cristo dentro da comunidade católica, dia que antecede o domingo de páscoa.

Naquele ano era neste dia. 

Minha mãe conta que acordou cedo, pois queria fazer pão doce para esperar as visitas.

Em seguida a Kamila já estava ao lado dela, vestida com um casacão do meu pai. Minha mãe achou engraçado, mas pediu para tirar pois não estava tão frio.

Ela obedeceu.

Ao retornar minha mãe já estava com as argolas do fogão a lenha escancaradas e com palhas e gravetos para o acender o fogo. 

Ela tinha o costume de molhar alguns gravetos com álcool ou querosene para mais rápido o fogo acender. 

Num descuido ela não fechou o frasco corretamente, e ao se declinar por cima do fogão para fechar as argolas, a tampa do álcool que estava preso à sua axila, salta da garrafa vindo a espalhar o mesmo pelo fogão, parede e pelo corpo da nossa pequena Kamila.

Foi tudo tão rápido, diz minha mãe que num instante o fogo já tomava conta de tudo.

Minha mãe então, pegou a pequena nos braços, Kamila tinha 4 aninhos, e levou até o tanque de lavar roupas, que por sorte estava cheio de água, enquanto gritava para meu pai vir ajudar ela salvava sua neta da morte.

Alguns dizem que não se pode jogar água num corpo em chamas, mas os médicos disseram que foi o que salvou minha filha. 

Acredito que devemos fazer o que a nossa intuição mandar na hora de ajudar alguém, nem sempre o que é técnico e correto.

Foi uma correria, meus pais não tinham carro, enquanto ele foi chamar o vizinho, minha mãe cuidou da Kamila, explicava que iriam levar ela ao hospital.

Ela na inocência ou num estado já ultrapassado de consciência dizia que não precisava, que ela não tinha dor, que estava tudo bem.

Parecia que quem consolava era ela à minha mãe.

Mas no momento que ela pega sua pele soltando do seu braço, aí ela pede pra ir ao médico.

Eu morava na cidade próxima uns 20km.

Após deixarem a Kamila na sala de cirurgia meu pai foi me buscar.

Até hoje me gela o corpo quando ouço o toc toc toc de um bater na porta de madeira.

Toda vez lembro do momento em que meu pai chega em minha casa para falar do ocorrido.

Todo sem jeito, coitado, imagino a dor dele, se enrolou todo para dizer a realidade dos fatos.

Que iríamos ter que levar para Curitiba no hospital especializado.

Eu não sabia o que fazer, sei que coloquei algumas roupas nada a ver com o momento.

Tive que voltar no outro dia para me preparar melhor para na segunda seguirmos viagem com a ambulância até Curitiba. 

Foram dois dias de hospital aqui na cidade, o doutor não me deu esperança de vida para ela.

Eles não tinham conhecimento para tratar algo tão grandioso.

Mas acredito que fizeram o que puderam na época. 

Minha filha ia inchando cada minuto mais, nossa preocupação era os rins pararem.

Minha mãe na sua fé infinita e grandiosa pedia para que ao menos os olhos não se fechassem, para que ela pudesse ver a quantidade enorme de pessoas que vinham lhe visitar e ela se sentir amada.

Ela era uma criança encantadora, todos admiravam sua beleza, sua pele macia, seu sorriso, sua educação.

Enfim, saímos daqui, doze horas de viagem em uma ambulância que não tinha nem como deixar o soro para ela se hidratar, fui raspando maçã e dando para ela.

Chegando lá, não havia vaga, o responsável daqui ficou de avisar que estávamos indo, mas acredito que esqueceu. 

Somente aceitaram pelo estado grave em que estava. 

Alívio ao meu coração.

Sabia que ali era o melhor dos lugares para ela se recuperar.

Outro dilema, eu não conhecia nada de Curitiba, nunca havia saído da minha cidadezinha, por sorte uma irmão do genitor da Kamila conhecia um casal que me hospedaram com amor e carinho.

Permaneci na casa deles durante os 45 dias que a Kamila ficou internada.

 Todo dia ligando para saber como estava e toda vez o médico não dava muitas esperanças. 

Foram dias horríveis que não desejo para ninguém passar. 

Eu nunca orei tanto, nunca dobrei meu joelho diante do Deus, do universo lhe pedindo algo, tantas e quantas vezes eu o faria novamente pela minha filha.  Enfim a luz divina iluminou minhas noites escuras,  milagres, eu creio em milagres,  eu creio que para Deus nada é impossível.

Depois de tantas noites sem dormir, uma boa noticia, que ela estava reagindo.

Minha filha saiu do hospital sem cabelos, com a pele cheia de cicatrizes, imagino a cicatriz que está na sua alma.

Imagino como foram essas noites escuras para ela, para minha mãe, e meu pai que tanto zelavam enquanto ela ficava com eles. 

Os dias de cuidados não paravam, era necessário o uso de uma malha para que os queloides não ficassem muito grossos, dias de sofrimento, porque isso a sufocava, sofria bullying na escola, mas ela não reclamava. 

Sempre trabalhei a sua auto estima, por mais que eu mesma não acreditasse que era possível alguém ser feliz com tamanhas cicatrizes, mas nunca deixei que ela percebesse a minha dor.

A única vez que ela me viu chorar por isso foi quando aos 10 aninhos ela se  parou na frente do espelho para se arrumar para escola, passou sua mão em seu rosto, ficou parada por alguns segundos se olhando.

Perguntei o que foi minha filha, ela disse:

- Esse rosto feio mãe.

Aí não contive minhas lágrimas.

Nos abraçamos, busquei forças e falei que o que há de mais precioso está em nosso interior.

Foi para a escola mais tranquila.

Detalhe, minha mãe só contou a história verdadeira, da forma que aconteceu 20 anos depois, após eu ter constelado.

O medo de culparmos ela era tanto que ela dizia que a própria Kamila havia pego e derramado álcool no fogão. 

Constelei o tema e  oito dias depois ela pede para conversar comigo e relata a verdade.

Aí juntas choramos, nos confortamos e seguimos. 

Hoje minha filha está com 27 anos, casada, me deu um neto lindo, a vida seguiu adiante. 

Peço que a luz divina ilumine as noites de cada um.

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