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LAÇOS DE FAMÍLIA - A HISTÓRIA DE MEUS PAIS

LAÇOS DE FAMÍLIA - A HISTÓRIA DE  MEUS PAIS
Bianca Portela
fev. 12 - 8 min de leitura
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Quando meu pai se casou com minha mãe, ele já vinha de um primeiro casamento, onde ele tinha três filhos. Esse casamento terminou de forma trágica onde, pelo que dizem as más línguas, teve traição.

Sua mulher estava tendo um caso com um homem e os dois eram casados. Parece que era uma paixão muito forte, mas não sobreviveu ao impacto do fim trágico do casamento, onde ela foi obrigada a deixar a cidade com os três filhos.

Na época meu pai era um psiquiatra/psicanalista de peso e tinha uma reputação a cuidar. Muito famoso, ele ficou vulnerável e se sentiu ameaçado. Por isso expulsou ela da cidade.

Meu pai nasceu no interior de Minas, era um dos mais novos e era muito agarrado com o pai. O pai faleceu e a família passou muita dificuldade.

Por razões que desconhecemos, meu pai sempre disse odiar sua mãe e que mãe tem o poder de acabar com a vida do filho. Por isso ele nunca quis ter filhos, e então teve quatro. A família se mudou para BH atrás de uma vida com mais oportunidade. Eles foram morar na mesma rua da minha avó que estava casada com seu primeiro marido, meu avô biológico, um advogado. 

Minhas duas avós, materna e paterna, se encontravam muito, jogavam buraco juntas e se tornaram grandes amigas. Dos filhos da minha avó paterna, o único que fez faculdade foi o meu pai. Para tal, ele se mudou para a casa da minha avó, que na época já estava no seu segundo casamento, com o policial civil que era na verdade, o noivo da minha tia, a irmã do meu pai.

Os dois se conheceram numa dessas noites de buraco e se apaixonaram. Minha vó já tinha se separado do primeiro marido, já tinha a minha mãe que estava com uns dois aninhos e estava sofrendo muito preconceito e o noivo da minha tia, já estava em processo de terminar o noivado. 

Enfim, eles se casaram e o marido de minha avó assumiu minha mãe, proibindo o seu pai biológico de chegar perto dela, afastando assim toda a família paterna dela. Minha avó aceitou porque ficou com medo do pai levar sua filha, como ele havia ameaçado. Fizeram o que achavam ser melhor para a minha mãe. 

Logo depois meu pai decidiu que faria medicina e como não tinham condições financeiras de sustentá-lo para que ele pudesse se dedicar aos estudos, minha avó e seu marido, ex noivo da irmã do meu pai, levaram ele para sua casa e o sustentaram até ele entrar para a faculdade e começar a andar com as próprias pernas.

Talvez fosse uma maneira que o marido de minha avó arrumou para reparar o dano causado com a ex noiva e ex sogra. Enfim, enquanto meu pai estudava o dia todo no quarto, minha mãe corria pela casa sem poder atrapalhá-lo. De vez em quando ela entrava no quarto e ele a pegava no colo para brincar. Ela cresceu com a presença dele em casa. 

Meu pai passou no vestibular em primeiro lugar e começou seus estudos na UFMG. Como já era seu destino, ele se tornou um dos melhores alunos da classe e seu esforço foi recompensado com trabalho e dinheiro. Assim ele foi adquirindo sua independência e saiu da casa da minha avó. Casou com sua primeira esposa e o fim eu já contei no início desse texto. 

Minha mãe também sofreu muito preconceito enquanto criança. Filha de uma mulher divorciada, ela foi impedida de brincar com determinadas crianças e até de assistir televisão na casa da vizinha. Na época, pouquíssimas pessoas tinham um aparelho de TV e com isso meu avô, marido da minha avó, comprou uma para minha mãe assistir. Assim ela foi criada, com um padrasto no lugar do pai. O pai foi apagado da história dela, da vida dela. Minha avó teve mais dois filhos. 

Minha mãe era uma mulher muito bonita e muito cobiçada. Ela terminou um namoro de muito tempo para casar com meu pai que na época já era divorciado. Assim que eles se tornaram um par, ela incluiu os filhos do meu pai na relação. Depois de casada fez questão de fazer um quarto para cada na casa deles.

Por alguma razão, o casamento deles não deu certo. Minha avó diz que entregou uma filha saudável e ele devolveu uma filha doente. Meu pai e minha avó também não se relacionavam bem. Meus pais foram casados por cinco anos e eu tinha dois quando eles se separaram. Eu cresci em uma família em guerra. Avó, pai, mãe, irmãos, tios, todo mundo brigava com todo mundo. Era amor e ódio, amigo e inimigo o tempo todo.

Eu era o único vínculo entre um lado e o outro.  

Depois do meu pai, minha mãe casou mais três vezes. Eu cresci indo para lá e para cá. Pulando de casa em casa, de marido em marido. Até o dia em que minha mãe foi para o estrangeiro atrás do quarto marido e eu fiquei com minha avó.

Nessa época eu senti estabilidade. Eu me lembro de estar sempre no meio do chumbo queimado e por várias vezes tendo que escolher entre um e outro. Enquanto um lado falava mal do outro, o outro falava mal desse.

Eu no meio, me sentia sozinha, dividida, confusa e sem referência.  

Eu não tive a mãe que eu queria mas hoje eu descobri que tive a mãe que eu precisava ter. Por toda vida eu pensei que ela tinha me abandonado, assim eu sentia. Abandonada. Incapaz de ser amada, pois nem quem me deu a vida me amou.

Mas, durante minhas aulas nesse curso eu descobri que foi exatamente o contrário. Abandonar é deixar de estar perto, escolher estar longe. É deixar ir, sem razão. E no entanto, ela me levou. Me levou para todos os lugares, com todos os seus maridos. Ela quis me amar, mas não conseguiu. 

Como posso julgá-la por isso? Amar um filho é tão difícil, é tanta dor. Quando meus filhos choram, eu morro por dentro. Quando eles saem para vida, eu morro por dentro. É um amor imensurável que precisamos parar de julgar as mães que não correspondem ao ideal de ser mãe.

Chega de judiar da mulher. Meu pai judiou das mulheres, da mãe, das irmãs, das filhas. Eu só entendi isso muito tempo depois.

Eu achava que era pessoal quando o problema dele era com o feminino. 

Eu vou morrer sem saber o que aconteceu, mas o peso eu tirei de mim. Eu hoje sei que ele foi o melhor pai que poderia ter sido. Do jeito dele, dentro das limitações dele. Eu sou muito agradecida pelos dois.

Eles andam comigo hoje porque eu sou eles. Eles me fizeram quem eu sou hoje. Somos uma família e eu só tenho amor por eles.

Olhando com carinho a história dos dois, eu vejo claramente como foi difícil e como as feridas não curadas chegaram até mim.

Eu não sou responsável pela vida deles, pelo mal que passaram, mas eu sou responsável pela vida dos meus filhos e entendo que esse mal, essa culpa passada, termina aqui.

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