Perdi meu pai aos 10 anos. Ele morreu devido a uma doença chamada bronquite asmática, que a cada ano se agravava mais e mais. Na noite em que ele morreu, vieram avisar minha mãe de madrugada, ele estava sendo levado para uma cidade maior, pois o estado dele tinha se agravado.
Eu acordei e minha mãe disse que meu pai havia morrido e me mandou voltar para a cama, comecei a tremer e os dentes batiam um no outro de tanto que eu tremia, disse para minha mãe que eu não conseguia dormir.
Então, ela me chamou para sua cama e ali passei a dormir junto com minha mãe, até meus 16 anos.
Eu era uma criança que morria de medo dos mortos, mas não tinha medo de dormir no lugar do meu pai, e hoje eu sei: era pra ficar pertinho dele. No entanto, achava que meu pai não me amava pois era muito bravo e tinha medo dele, era tanto medo que eu tinha dificuldade de entregar os cartões que a professora mandava fazer no dia dos pais para ele.
Eu relutava para entregar e não me lembro de nenhum abraço que eu tenha dado ao meu pai ou recebido dele.
Há pouco tempo fiz uma constelação na água onde o boneco que me representava não desgrudava do boneco que representava meu pai. Vi ali quanto amor tenho por ele e o quanto já fiz por lealdade a ele. Senti também o amor dele por mim.
Um amor com vínculo interrompido, com uma grande surra que eu e meu irmão levamos de nosso pai por bobeira de criança, ele não gostava que fizéssemos bagunça.
Hoje penso que talvez ele tenha feito isso para que eu me afastasse dele, para não sofrer quando ele morresse, porque pediu para nosso tio, seu irmão, que cuidasse de nós, pois sabia que não iria viver muito.
Com isso, me afastei mesmo achando que não o amava bastante como amava minha mãe, pois sempre pensava , ainda bem que não foi a mãe que morreu.
Mas que nada, passei minha vida inteira reivindicando esse amor e agora sei, com meu pai tive um vínculo de amor interrompido com aquela surra de cinto que não doeu somente no corpo, mas principalmente na alma.
Agora está tudo bem meu pai, porque eu te perdoei e peço que me perdoe também, por viver esses anos todos achando que o senhor não me amava. Tenho ainda na mente e no coração momentos de amor para comigo, embora tenham ficado escondidos, camuflados, por todos esses anos depois da surra.
Eu te amo meu pai, e agora sinto o teu amor por mim também. Eu te honro e sigo na vida te honrando e amando pois está vivo em mim e em meus irmãos.
Como é bom sentir esse amor, agora eu sei.