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DEZEMBROS... JANEIROS

DEZEMBROS... JANEIROS
Márcia Regina Valderamos
dez. 4 - 9 min de leitura
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Nunca gostei desses meses. Não entendia porque todos ficavam tão felizes quando chegava o fim de ano. Desde que me conheço por gente, quando chegava essa época eu me sentia melancólica, muito triste.

Eu sempre questionei o que era comemorado nesses tempos festivos. Aqui em casa nem árvore de natal é montada. Dia de natal? Só tristeza. Um jogado na cama bêbado, outra na igreja ou brava pela casa, e eu e meu irmão nascido, o caçula, esperando... hoje entendo, mas não entendia naquele tempo. Presentes? Só quando a empresa que nosso pai por ventura estivesse trabalhando desse para os seus funcionários levarem aos seus filhos.

Um dia o papai tomou coragem e comprou uma bicicleta para o meu irmão. Foi uma alegria que durou pouco porque logo começamos a ouvir as reclamações da nossa mãe porque não havia dinheiro para paga-la. Creio que foi comprada à prestações, pelo modo como a mãe falava. Nem sei o que foi feito desse presente, assim como outras alegrias fugazes que fomos perdendo após ter recebido com tanta esperança: nosso cachorro (deu sarna e tiveram que encaminhar ele para não contaminar as crianças; a minha coleção da Barsa que a mãe comprou depois de tanto eu pedir. Pranteei tanto quando ela que eu era a causadora do transtorno: “Viu? Não falei que não dava para pagar? Tem que devolver.”

Dia de ano novo? Que ano novo? Novo por quê? Tudo se repetia, com o agravante nesse dia de muita bebida alcoólica na casa das avós, muita briga, muita tristeza! Adultos disfuncionais e crianças infelizes crescendo disfuncionais.

O pior estava por vir. Aos 30 anos recebi um grande presente em dezembro. Nem acreditava! Minha primeira sobrinha, filha mais velha do meu irmão, nasceu dia 13/12/1988, que Graça Divina! A menina mais linda do mundo, com o sorriso mais encantador, os olhinhos mais maravilhosos que eu já havia visto! Meu pai não enxergava mais devido a retinopatia diabética, mas ficou tão feliz com a chegada da primeira neta que a sua saúde melhorou demais.

Ah, nasceu a esperança de prováveis dezembros e janeiros felizes. E durante 11 anos assim fizemos. Eu e meu fiel companheiro, meu marido que também chegou próximo de dezembro/88 na minha vida, transformávamos aquelas noites de natal e ano novo em algo de fantasia para as nossas princesas.

A Thalita, primogênita linda, maravilhosa e a princesinha de Jesus, Rebeca bijuzinho, linda, sua irmã caçula. Até que um dia um jovem totalmente drogado, dirigindo em alta velocidade atropelou a nossa Thalita e passou com a roda traseira do veículo várias vezes por cima do braço esquerdo dela, tentando evadir do local, queimando gravemente o braço e o dorso da mãozinha dela.

Dor, sofrimento, medo, pânico, hospital, tratamento para queimaduras graves, luta durante um ano, até que veio o diagnóstico trágico: Rabdomiossarcoma alveolar no no braço agredido. O câncer foi agressivo, a quimioterapia pesada, e minha menina com medo, mas com fé. Os médicos queriam amputar e a minha amada cunhada, mãe guardiã guerreira, cheia de fé em Jesus Cristo, não permitiu. Ela orava, jejuava junto com o meu amado irmão e com a nossa mãe, que na época já era muito fervorosa também, cuja sensibilidade e amorosidade aflorou quando a Thalita nasceu e trouxe à tona toda a sua doçura e ternura quando a Rebeca veio coroar a sua vida e a nossa.

As netas eram só grude com a vó. Principalmente a Thalita. Nosso pai já havia falecido alguns meses antes da Rebeca nascer. A apreensão e o sofrimento com o tratamento e os sintomas da Thalita eram enormes, mas pela fé ela foi vencendo, fazendo tudo o que os médicos mandavam, perdendo os lindos cabelos, mas sem parar de estudar, ir a igreja.

Nós confiávamos que ela seria curada, apesar dos médicos sempre dizerem o contrário, para não termos esperanças. Seguíamos com dezembros e janeiros cheios de esperança e fé. No dia 09/01/2008 a nossa princesa descansou. Estava com 19 anos, tinha passado para o 2º ano da Faculdade de Direito e a ultima imagem que tenho é dela sentada na cama do hospital, recostada nos travesseiros, com os olhos que eu amava, abertos, como que me vendo, aquele sorriso de canto de boca, como se a qualquer momento fosse me falar: “Oi tia. Está tudo bem. Se cuidem a senhora e o tio, viu? Amo vocês.”

Mas ela já não estava mais ali, havia partido há 5 minutos. Coloquei a mão em seus pés e não era mais ela, mas uma pedra de gelo. Corri para o corredor do hospital, longe de todo mundo, queria ir com ela e gritei, chorei, e ouvi, bem baixinho no meu ouvido o Espírito Santo dizendo, com amor: “Está consumado!”

Senti uma brisa nos meus cabelos. Me veio paz. Me acalmei. Ela descansou e não sofre mais, pensei. Aceitei. Agradeci chorando, agora baixinho, calmamente, por tudo o que de bom a vida da minha menina, que tive como uma filha, me trouxe! Voltei e ajudei no que precisava ser feito.

Carreguei o corpo dela pela ultima vez naquele pedaço de madeira. Deixei com tantas flores o entorno dela, rosas e margaridas brancas, amarelas e vermelhas, como ela gostava. Um jardim! Nunca mais a vi. Ela nunca mais sairá de mim!

Em 21/12 do mesmo ano de 2008, sem que houvesse uma única razão médica para que acontecesse, minha mãe foi ficar com ela. Se despediu de nós um dia antes, com um sorriso com o olhar perdido. Comentei com o meu irmão que parecia que ela estava vendo Jesus Cristo, vendo anjos. Ela estava em paz, tão linda! Meu irmão então falou “Imagina! Ela vai nos contar tudo o que está vendo, logo, logo, não é mãe?”

Repentinamente ela ficou lúcida e disse olhando para o meu irmão, com a voz firme, chamando-o pelo nome, como dificilmente fazia: “Nem tudo a gente pode contar, Milton.” Dia seguinte, de madrugada, ela foi para Jesus, ficar com a neta, com o meu pai, com seus pais e com todos os nossos amados para sempre. Todos estão sempre em mim e lá no céu.

Desde então, sem desespero, sem revolta, sem reclamação, mas com muitas saudades, meus dezembros e janeiros são assim: melancólicos, tristonhos, saudosos, mas agora eu sei. Já havia iniciado várias transformações em mim e na minha vida desde que tudo começou a acontecer e quando minhas amadas se foram fiz reviravoltas para melhor em meu modo de ser, na minha profissão, no meu dia a dia. A partir do momento que conheci Olinda Guedes e o Pensamento Sistêmico, comecei a compreender na alma tudo o que vivi e como vivi até aqui.

Ela sempre diz e é a mais pura verdade:

“A vida não é fácil para ninguém. A vida é um sopro e ao mesmo tempo é eterna.”

Nada foi em vão, eu já acreditava nisso, agora eu tenho certeza. Uma colega perguntou em um desses velórios dos meus entes queridos o que nós fazíamos para ter paz e tranquilidade diante dos desígnios de Deus. Eu só sorri para ela, não disse nada. Não tem como explicar. O Colo do Pai e da Grande Mãe nos conforta e nos fortalece, só por Eles nos mantemos no caminho que foi traçado para nós nessa terra.

Agora sei que estamos todos à serviço e que, através do amor consciente posso ajudar o meu sistema. Não precisa mais se repetir tanta dor, tanto sofrimento. Isso se encerra aqui. A nossa Rebeca não precisará passar por isso, nem ninguém mais.

Sinto muito! Me perdoe! Eu te amo! Sou muito grata!

Descansem em paz! Vejo todos vocês e os honrarei com minha saúde e com o que eu fizer de bom do que me deixaram. Gratidão por terem superado, resistido! Gratidão pela vida que permitiram que chegasse até mim! Gratidão!

 

Thalita

Seu sorriso não sai de mim.

Ele faz brilhar a minha alma;

é farol na escuridão dos dias sem você.

Construímos juntas uma ponte de você para mim, de mim para você

Através da qual a vida flui e o amor se faz;

Esse que é o verdadeiro e real amor,

amor que vincula sem adoecer,

Amor que ama sem prender,

Que deixa solto o que tem que ir sem jamais se arrepender.

Para sempre juntas nas nossas almas

Distantes fisicamente e tão juntas no coração!

Te amo infinita e eternamente, princesa Tha!

Gratidão por sua vida em minha vida

A sua vida preciosa, que no dia 13/12/2020 fará 32 anos de pura Graça Divina!

 


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