Então um dia eu acordei sozinho.
Não tinha idade nem para caminhar direito.
Procurei, procurei e ninguém.
Era verão. O calor era de rachar.
Não. Era inverno.
Nevava. O frio cortava.
Eu chorava, chorava. Não entendia.
Chovia.
Chuva fina e mansa.
Tempestade e trovão.
Relâmpago apavorante.
Fez-se noite no sertão.
Floresta densa. Interior. América.
Não, não era.
Era noite no meio do arsenal.
Tiros. Explosões!
Um barulho infernal.
Leste Europeu?
Espanha? México?
Oriente? África?
Que aramado é esse? E esse cheiro de gás, de carne assada, cães latindo, quem corre atrás de mim? Porquê?
Por todos os lados.
1900.
Sangue. Mataram minha gente.
Foi aqui no capinzal?
Não. Foi na floresta quente.
Não. Foi aqui no meio da neve, afinal!
Lá na fornalha queimando, lá no que é de escravizal.
Por todo canto tem sangue.
Cheiro de morte.
Daqui eu vou fugir.
Sou pequeno. Não tem ninguém.
Tenho medo.
Para onde ir?
Não sei. Não sei nem se consigo, mas aqui não posso ficar.
E foram muitas, muitas, muitas distâncias.
deserto, mar, terror!
E vim não sei nem como e estou
Estou? Onde?
Agora e sempre vou procurar.
Fica.
Agora eu sei onde você está.
Me achei com você eu sei.
Me encontrei aqui.
Eu vi.
Bom estar e sentir.
Guardar as facas e os punhais,
Abaixar as armas, as guardas e seguir.
Tira as botas, soltar os arcos, as flechas,
Desce e solta os arreios.
Fica. Descansa.
Repousa.
Fico!
Ouço canções aos invés de explosões.
O clima é ameno e agradável.
Sei que agora sou querido mesmo eu tendo sido,
Nem importa o que de verdade,
Já que já não sou mais.
Porque eu curo a saudade,
Nesse amor que me tem acolhido.
Sim, meu querido,
Meu coração é teu.
Fica para a eternidade.
Porque saiba: Você sou eu!